domingo, 9 de dezembro de 2007

SECHIUM EDULE - Instalação artística de MARTINHO MENDES

MARTINHO MENDES

Natural do Estreito de Câmara de Lobos, nasceu em 1981.


Licenciado em Artes Plásticas – Ramo de Ensino, pelo Departamento de Arte e Design da Universidade da Madeira. É professor de Artes Visuais e exerce actualmente funções de coordenação técnico-pedagógica no serviço educativo do Museu de Arte Sacra do Funchal

Participou em exposições colectivas desde 1999 ao nível do contexto regional, nacional e internacional. Em 2006, no Funchal, realizou a sua primeira exposição indivdual intitulada " A casa na encruzilhada". Foi distinguido com prémios do domínio da fotografia e pintura, nomeadamente no 1º Concurso Nacional de Fotografia da Póvoa do Varzim (2003) e Concurso de Artes Plásticas promovido pela loja do cidadão (2006).




A Instalação artística – Sechium Edule

A instalação artística de Martinho Mendes apresentada na exposição colectiva e que este Blog se reporta, tem como título emprestado o nome científico da hortaliça – fruto, conhecido entre os madeirenses como pepinela ou pimpinela.

Numa visita inicial ao espaço onde agora se apresenta exposição Quartos Vagos foi possível observar no pátio / jardim da casa, um conjunto destes vegetais, caídos e espalhados aleatoriamente, quer pelo chão pavimentado quer por cima dos locais mais inusitados – uma sanita que se tornou canteiro ou uma poça de lavar roupa agora contentor, fatidicamente temporário, de uma porção de terra para cultivo.


Curioso foi verificar que as pepinelas (Sechium Edule) encontravam-se pelo chão quais orgânicos seixos rolados, ávidos de encontrar terreno fértil para afincar o seu rebento que explode de vida ao rasgar a forma arredondada deste fruto, também considerado como sendo um vegetal.
Com efeito, é a partir deste vislumbre factual e de uma espécie de advertência a todo o espaço desta casa, ultimada pela presença altiva e ameaçadora de uma grua de construção numa obra vizinha, que a instalação artística SECHIUM EDULE ganha tendência metafórica.



As pepinelas, com os seus rebentos sequiosos de terra para poderem medrar, representam de certa forma a vontade, a força e a esperança de naquele espaço continuarem a viver, verdejantes como estão ainda a planta mãe carregada de pepinelas, a árvore das mangas com os seus pequenos frutos em crescimento, a bananeira com o seu verde cacho ou mesmo até a parreira de uva americana que se começa a despir das suas folhas para a esperançada fase seguinte – desconhece esta videira que o seu ciclo de vida acabará, possivelmente, por aqui, sem espaço para outra poda que receba a Primavera.

SECHIUM EDULE é um projecto que parte, inicialmente, de uma abordagem e intervenção do exterior da casa para o interior de um dos quartos numa relação tão complementar quanto hiperbólica.

Como forma de chamada de atenção para a observaçãonaturalista do mote tomado como base para o projecto, no jardim/pátio exterior, é possível observar uma inusitada e discreta intervenção – uma folha com informações botânicas e culinárias do vegetal; o desenho desse vegetal recortado e colocado a pender directamente da planta matriz, lançando uma aparente confusão entre o que é o desenho próximo do real e o vegetal real pendente da planta .


O interior do quarto, por outro lado, é uma encenação simbólica, algo bizarra, que parte da desconstrução do remate de tecto estucado numa ligação à ideia de luz, factor imprescindível à orientação e à vida de quem ali habitou ou viveu.

Tal intento, surge corporizado pela presença exagerada dos desenhos das pepinelas que, iluminadas com luz artificial e proliferando em quantidade por todo o espaço numa espécie de força desgovernada e expressiva, denunciam, ainda, o apelo e a luta por um enraizamento a um espaço que se encontra na eminência de desaparecer.


As janelas desta casa encontram-se já fechadas e o nicho que as enquadrava já não deixa passar a luz natural. Em lugar disso, os nichos que circunscrevem as janelas, apresentam uma premonitória representação pictórica da ideia de casa, à maneira de uma memória esbatida. Ao mesmo tempo que naquele quarto, palco de um espectáculo, se assiste a uma luta simbólica, o desenlace, ao fim de contas, sempre se encontrou escrito e presente nas paredes avermelhadas: “Quem vive de esperanças, morre em jejum”.


Numa ilha comummente explorada, esfolada e vendida a retalho, esta instalação traduz-se tão-somente num ponto de partida para uma reflexão extensiva, não particularizada, acerca do sentido de territorialidade, da legitimidade ou não da extinção e perturbação de determinados espaços físicos bem como das inerências ambivalentes que determinadas decisões, respeitantes a este domínio, comportam.



Martinho Mendes
DEZEMBRO DE 2007


3 comentários:

Sandra disse...

Mais uma vez, um excelente trabalho ! Digo mais uma vez, porque já tive oportunidade de ver e cheguei inclusive a participar em algumas das suas iniciativas, e prontos. É sempre aquela coisa que no ínicio fica muito a desejar, pois não sabemos ao certo o que é que vai sair dali, mas no fim acaba SEMPRE por surpreender.
Muitos parabéns :D, continue!

Anónimo disse...

Gostei muito da tua instalação. Parece-me ser um trabalho muito atento, telúrico e de resistência. Uma atenção e uma consciência muito pertinente, delicada e desesperadamente inquietante e paradoxalmente doce, pela atenção às pequenas coisas onde afinal reside a verdadeira beleza. E pela exaltação dada à natureza face à inospitabilidade destes nossos tempos trucidantes. O teu trabalho é assim como um clareira!

efervescente disse...

olá querido amigo...não tive oportunidade de estar presente mas a reportagem fotográfica clarifica-me o espaço distante e a sua intenção. Sabes bem que gosto particularmente do teu trabalho e da forma como captas pormenores da herança colectiva da ilha. As novas problematizações em que os inseres e todo esse novo embrulho simbólico em que os envolves, fazem com que nos remitamos à reflexão da cultura social e cultural do nosso ilhéu. Parabéns...